15.12.11

cantinho do avillez

[É assim o Cantinho do Avillez, ao Chiado (fotos de divulgação)]

E ontem, quem segue José Avillez no Facebook ficou a saber que, entre bifanas, entrevistas, conferências de imprensa e fotos com António Lobo Antunes, Anthony Bourdain, o homem de quem tanto se falou e escreveu nas últimas semanas a propósito do "No Reservations" que veio gravar a Lisboa para ir ao ar em Abril, arranjou tempo para dar o ar da sua graça no Cantinho do Avillez.

Foi o próprio chef — ou quem lhe faz a assessoria — que não resistiu a partilhar uma foto da foto no seu mural. Não é para menos. Bem ou mal, todos parecem ter alguma coisa a dizer sobre Bourdain, pelo que não custa nada aproveitar a "boleia" mediática. 

[José Avillez no seu Cantinho (foto de divulgação)]

Não que Avillez precise. Com casa cheia (no sábado passado, só consegui reserva para o turno das 22.30 e ainda assim com alguns dias de antecedência) e a imprensa toda à sua roda, só os muito distraídos é que ainda não deram pelo seu Cantinho num dos recantos mais sossegados do Chiado, pouco abaixo do São Carlos.


[Arquitetura de Ana Anahory e decoração de Felipa Almeida (foto de divulgação)]


Entre o pronto-a-comer das empadas (já aqui devidamente testadas e comentadas) e a papa fina do tão aguardado Belcanto — também no Chiado, paredes-meias com o Largo do chef Miguel Castro e Silva, passei à sua porta dias atrás e não me pareceu para já, mas posso estar enganado... —, o Cantinho é assim, à primeira vista, uma espécie de meio-termo.


[A instalação de Joana Astolfi tornou-se a "imagem" do Cantinho (foto de divulgação)]


E que ninguém leia nas entrelinhas um reparo negativo.


[Procedências diversas para um ambiente cheio de detalhes (foto de divulgação)]


O Cantinho é, assumidamente, um espaço de cozinha simples, mas com toque de mestre, destinado a servir pratos do dia-a-dia de forma criativa, em ambiente descontraído e com uma boa relação qualidade-preço.


[Talheres da Costa Nova e pratos do pão de um serviço de louça criado por Bordallo Pinheiro, são vários os apontamentos portugueses (foto de divulgação)]


E, posso adiantar-me desde já, cumpre o seu objetivo perfeitamente. Poderá até defraudar alguns, que possam ir ali ao engano à procura do que certamente só irão encontrar no Belcanto, mas acho que ninguém poderá dizer que não vale o que custa.


Arrisco mesmo dizer que vale mais do que custa. Porque, a verdade é esta, não é caro para aquilo a que se propõe (e cumpre).


Avillez, escrevi-o antes, não tem pruridos em colocar o seu nome em projetos mais comerciais. É novo, talentoso e ambicioso, mas é também um homem de negócios. Já o provou e eu não vejo mal nisso. É até uma das coisas que admiro e que me ajudam a equilibrar a sensação de que, independentemente do seu inegável talento, é muitas vezes levado "ao colo" pela crítica lusa (e não só).


Avillez, é um facto, agrada. 


O Cantinho, como o nome já indicia, é pequeno, mas não atrofia. Depois da entrada, e antes da cozinha, a mesa comprida mais desejada, mas que resulta apenas para grupos, fica junto ao nicho onde a artista plástica Joana Astolfi encavalitou peças de outros tempos que todos reconhecemos. A memorabilia pegou e é hoje o cartão de visita da casa.


À esquerda, para quem entra, a única sala propriamente dita, onde os detalhes pensados por Avillez e pela decoradora Felipa Almeida saltam ou não à vista. Depende do "olho" e da informação que se leva.


Candeeiros vintage e cadeiras desirmanadas. O recurso não é novo, mas ajuda ter, entre peças com ar Ikea e outras arrematadas na Feira da Ladra ou em leilões do eBay, umas quantas reproduções coloridas da cadeira DSW de Charles & Ray Eames.


Há ainda uma parede que parece ser de madeira demolida, mas que é afinal papel trompe-l'oeil. Pra valer, gostei mesmo muito dos pratos e talheres da Costa Nova, dos pratos do pão do serviço "Couves" da Bordallo Pinheiro, das pequenas assadeiras em ferro da Staub ou até de algumas peças desenhadas por Avillez.


Pode parecer que estou a dar demasiada atenção aos detalhes. Porventura, até estou. Mas eles são importantes para entender, e apreciar, aquilo a que Avillez se propõe na sua carta.


A profusão de petiscos na mesma, bem como de entradas que se prestam a ser partilhadas, poderiam levar-nos a pensar que se trata de mais uma tasca ou taberna moderna, mas não é por ai. Os petiscos portugueses, mais ou menos tradicionais, estão lá, mas há também receitas familiares, criações novas e outras claramente influenciadas por viagens.


[A farinheira com crosta de broa e coentros (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]


Nas entradas, resisti às vieiras marinadas com creme de abacate (que provara antes, na edição deste ano do Peixe em Lisboa) e aos peixinhos da horta, e partilhei à mesa uma dose de farinheira com broa e coentros (gosto de farinheira do jeito que for, mas esta versão fica deliciosamente crocante) e outra de empadinhas de perdiz, bacon e cebolinha (massa boa, seca e fina: recheio aveludado e apaladado).


[As empadinhas de perdiz, bacon e cebolinha (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]


Antes disso, o couvert, composto por pães da Quinoa (a padaria artesanal do Chiado, de quem falei aqui, é uma parceira), azeitonas, manteiga e paté de tomate (delicioso!), entreteve muito bem o nosso palato.


[Os ingredientes do Prego MX LX (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]


Como prato, não resistimos e escolhemos um que, de tão comentado, se tornou um "must have" da casa: o famoso prego MX LX. Inspirado pelos tacos mexicanos, Avillez idealizou um esquema que mata dois coelhos de uma cajadada só. A ideia é simples: cada um monta o seu, dispondo para isso de tirinhas de carne de vaca, servida numa frigideira, e de ingredientes como malagueta, guacamole, lima ou cebola roxa, servidos em tacinhas, que devem depois ser enrolados a gosto em tortillas de milho.


[Cada um monta o seu prego nas tortillas de milho (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]


É o tipo de coisa que resulta em cheio e que muitos vão querer experimentar em casa.


[Sorvete de limão com manjericão e vodca (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]


Para sobremesa, um sorvete: cubos de limão com manjericão e vodca, só porque precisávamos de algo para limpar o palato, que fosse ao mesmo tempo leve e refrescante. Touché.


[Nos vinhos, um branco e um tinto produzidos por Avillez e José Bento dos Santos (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]


Não cheguei a experimentar nenhum dos cocktails que Avillez se gaba de ter na carta, mas prestei atenção aos vinhos. Os preços começam nos €12 por garrafa, sendo que há igualmente opções a copo. Escolhemos o tinto JA, que resultou de uma parceria de Avillez com o gastrónomo José Bento dos Santos. Bastante agradável de beber e bom preço: €14 a garrafa.


Na hora do café, Avillez confia num outro parceiro de peso, a Nespresso. Sei que é, cada vez mais, recorrente nos restaurantes, mas não me conformo. Não troco nenhum Nespresso por um bom café expresso tirado como deve ser. 


No final, uns muito razoáveis €20 por cabeça, gorjeta incluída, e satisfação generalizada de quem me acompanhava nessa noite.


O próximo jantar, já deixámos apalavrado, será no Belcanto, assim abra ele em breve.

Rua dos Duques de Bragança, 7, tel. 211 992 369, almoços, de seg. a sáb., entre as 12.30 e as 15.00; jantares, de seg. a sáb., entre as 19.30 e as 00.00

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