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19.9.12

qosqo, que é como quem diz cusco alfacinha

[O ceviche clássico de corvina (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]

Nunca o Peru esteve tão perto. E não há nada que enganar. A meio caminho entre a Praça do Comércio e a Casa dos Bicos, na castiça e bairrista rua dos Bacalhoeiros (quase, quase encostado à rua Padaria), assentou arraiais o Qosqo.

[À entrada, menu do dia a 13 euros (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]

O nome (Qosqo, que é como quem diz Cusco em quechua) não condiz com a enorme gravura que enche toda uma parede, e que retrata Machu Picchu e não Cuzco, mas isso é um mero detalhe. 

[Machu Picchu, e não Cuzco, domina a pequena sala do Qosqo (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]

Para ser exato, o Qosqo começou a tomar forma num outro endereço alfacinha, o restaurante Isaura da avenida Paris, onde Gabriela e Vasco fizeram dos jantares de sexta uma iniciação aos sabores peruanos. A aceitação tem sido tão boa que, animados, trataram de se juntar a mais dois sócios – o peruano Marco Leya e o português José Araújo – para abrir a casa dos Bacalhoeiros. É uma casa pequenina e despretensiosa, onde não cabem mais de vinte pessoas sentadas (contei!), mas arejada, luminosa e folclórica q.b.

[Porventura, o detalhe mais conseguido da decoração (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]

O espaço, sou sincero, não é o forte do Qosqo, mas depressa isso passa para segundo plano. Numa altura em que chefs como Gastón Acurio e Virgilio Martinez (em breve, contarei a minha passagem pelo novo Lima que abriu em Londres!) contribuem para colocar a gastronomia peruana nas alturas (ela é, a par da brasileira e da mexicana, uma das sensações mundiais do momento), a proposta do Qosqo é muito mais modesta; mas nem por isso de menosprezar. 

[Para começar uma Cusqueña e canchita (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]

Pelo contrário, embalados pelo portunhol do solícito empregado de mesa argentino e pela música de fundo andina, os nossos olhos fixam-se no menu escrito na ardósia por cima do balcão. Os menos afoitos podem sempre optar pelo menu do dia  — que sai por 13 euros com prato (chaufa de mariscos), bebida, sobremesa e café —, mas o meu conselho é que se lembre da velha máxima «quem não arrisca, não petisca». Nas bebidas, há sangria, imperial, mas também uma legítima cerveja peruana (a Cusqueña, uma Premium encorpada de pura cevada) e limonada (ao almoço dificilmente vai encontrar o famoso cocktail Pisco Sour). 

[As empanadas de carne de vaca (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]

Como aperitivo, a canchita (milho torrado, muito macio, que muitos descrevem acertadamente como uma pipoca que não estourou) faz as vezes dos nossos tremoços, ao passo que as empanadas de carne de vaca (no recheio vai também passas e a massa tem um polvilho doce que recebe bem a acidez de umas gotas de lima) são das entradas que mais saem.

[O ceviche mais em detalhe (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]

Nos pratos, há mais opções de frios do que quentes (por regra, só um, o que achei pouco), mas, na dúvida, escolha o ceviche da casa com corvina, camarões, rodelas de polvo e de lula marinados em sumo de lima, cebola roxa e picante. O camote, a batata doce laranja, dá uma textura extra muito bem-vinda ao prato, e quem quiser pode também acrescentar um pouco do milho torrado (este pequeno "truque" foi-me ensinado no restaurante londrino de Martinez, precisamente). 

[O arroz doce em versão peruana (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]

Para encerrar, a sobremesa da casa, que não gera unanimidades, é o arroz doce em versão peruana. Estive quase para passar, mas, a curiosidade falou mais alto. A verdade é que a dita, que leva também passas e uma espécie de doce de fruta, não acrescentou nada à refeição. Eu apostaria a minhas fichas em outras opções neste capítulo.

[A mistura de sabores na sobremesa (©joão miguel simões (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]

Mas o saldo final foi muito positivo. Comida saborosa, preço muito razoável (paguei cerca de 20 euros) e serviço amável.  À saída, invadiu-me uma agradável sensação de estar saciado, mas leve. E o desejo que os lisboetas aderiram a esta primeira incursão para valer da cozinha peruana em solo nacional.

Rua dos Bacalhoeiros, 26, tel. 218 868 061, de seg. a sáb, das 12.00 às 16.30 e das 19.00 às 00.00

6.8.12

a esperança é a última a morrer na sé

[A esplanada do Esperança da Sé (foto de divulgação)]

O tempo de pausa no blog (neste e nos outros que levam a "marca" @ddressbook) não foi premeditada, mas, entre vários afazeres (e para quem não sabe posso adiantar que, desde o número de maio, estou também a fazer a coordenação editorial da revista Volta ao Mundo), acabei por me ausentar mais do que o previsto ou desejado.

Vou-me redimir, prometo, nos próximos dias :)

Em fila de espera, o Esperança da Sé. Já deram por ele? Eu, mea culpa, só lá fui em junho.

Devo confessar que graças ao meu maravilhoso sentido de orientação, levei mais tempo a encontrá-lo do que deveria. Mas o problema não está na sua localização. É mesmo um caso grave, e sem fé, de desorientação.

À minha espera tinha uma amiga que, vira e mexe, torno cúmplice destas lambanças. E este é o meu primeiro conselho para quem ainda não foi ao Esperança da Sé: se puder, leve companhia. É o tipo de restaurante que se presta à partilha e à conversa.

Durante anos, o Esperança do Bairro Alto foi (suponho que ainda seja, mas há um bom tempo que só passo à porta) morada certa para quem queria um restaurante ao mesmo tempo cool e íntimo. A comida italiana cumpria e nos dias mais concorridos chegava a haver dois turnos de jantares para dar conta de tanta reserva. O ambiente "no escurinho do cinema" depressa tornou-se a sua marca registada, mas das vezes em que ali jantei, recordo-me, não me importaria nada que as luzes estivessem um ou dois tons acima (acho sempre complicado quando temos de andar à procura de um foco de luz para conseguir ler a ementa...).

[E a Sé logo ali, na rua em frente (foto de divulgação)]

Talvez por isso, uma das primeiras coisas que reparei ao entrar na Esperança-benjamim — e entrar é quase uma força de expressão, pois em dias de verão, o mais certo é estar de portadas abertas de par em par, atento à vida que corre em Alfama — foi na iluminação que, apesar de velada e com recurso também a velas, não é tão drástica. Melhor assim. Não se perde a carga romântica, e algo dramática, que vai bem com um edifício antigo recuperado e quase paredes-meias com a histórica Sé de Lisboa, mas também não temos de adivinhar a ementa.

Aberto há um ano, mais coisa menos coisa, este Esperança fez da esplanada, essa sim colada a um dos flancos da Sé, do outro lado do passeio, a principal novidade. Podendo escolher, eu talvez preferia onde fiquei, precisamente numa mesa à janela, com um pé dentro, mas com o olhar solto para me demorar, se preciso fosse, em cada pedra rebuscada da atração em frente. Isto porque a Sé, como monumento que é, encontra-se devidamente alumiada, mas sem nada de fantasmagórico. Pelo contrário, vista daquele ângulo, apresenta uma escala humana à dimensão do apelo castiço de Alfama.

[O Esperança da Sé está de pedra e cal num edifício antigo de Alfama (foto de divulgação)]

Assim é também o Esperança. Não chega a ser castiço, mas consegue ter uma atmosfera de bairro, sem ser bairrista, que não destoa.

E a comida, por que raio não estou a falar da comida? Afinal, não foi para isso que lá fomos?

A comida, como no do irmão mais velho, cumpre aquilo a que se propõe. Não se pode dizer que seja um restaurante barato para os padrões de Lisboa (conte com uma média de 25 euros por pessoa com vinho), mas é convivial, despretensioso e bem intencionado.

[Uma das criações mais recentes da casa: prato "três pastas" (foto de divulgação)]

Na ementa, há pizzas salgadas e doces, pastas, crepes, risottos e até uma parceria com os gelados Santini no capítulo das sobremesas. É uma cozinha italiana rápida, que no lugar dos velhos clássicos se permite já um toque de modernidade, apostando em combinações fáceis de degustar e de caírem no goto.

[O risotto nero, sucesso da casa (foto de divulgação)]

É o caso da Pizza Gourmet Fichi, que doseia a doçura dos figos com uma base de queijo de cabra e presunto de Parma, ou do prato "três pastas, que permite degustar de uma assentada spaghetti al parmegiano com tartufo, linguini de vieiras e ainda linguini nero fresco e gamberi. Favorito de muito é o risotto nero, assim chamado porque tingindo com a tinta dos chocos, levando ainda tomate, limão e bacon.

Rua São João da praça, nº 103, 
Alfama, tel. 218 870 189, aberto de seg. a sex., das 19.30 às 00.00; aos sáb., dom. e feriados, das 13.00 às 16.00 e das 19.30 às 00.00. 

27.4.11

trigo latino

[Ambiente retro, sem chegar a ser castiço, é a tónica dominante do Trigo Latino que ocupa as instalações de uma antiga dependência bancária (fotos D.R.)]

Quem nunca desesperou na hora de achar um restaurante à altura das expectativas e necessidades de um jantar de grupo que atire a primeira pedra. A questão torna-se tão mais complicada quando à disponibilidade e localização somamos ainda outros quesitos básicos como um preço aceitável e um menu capaz de saciar, e satisfazer, gregos e troianos.


Serve isto tudo para dizer que, apesar de ter as portas abertas desde Julho de 2009, um jantar recente de aniversário foi o pretexto para ficar a conhecer o Trigo Latino. Há quem se baralhe e hesite entre dizer que fica no bairro da Sé ou de Alfama. Certo mesmo é que se encontra — ou melhor, encontrei-o eu numa noite de chuva forte, em que caminhava quase às cegas e sem ver por onde punha os pés — numa paralela à avenida Infante Dom Henrique, na esquina da rua e do largo que respondem pelo mesmo nome: Terreiro do Trigo.


Antiga sede de um banco, como o comprova até hoje a caixa-forte, a sala apresenta-se com uma decoração intencionalmente retro que dá ares de café de tertúlia ao restaurante. Chão preto e branco, mesas quadradas e cadeiras de madeira, painéis pintados de verde a cobrir meia parede, deixando o resto livre para acomodar um sem-número de quinquilharias, entre fotografias e objectos, que nos remetem para outras histórias. O todo resulta à vista, conseguindo ser, ao mesmo tempo, acolhedor e confortável.


Na ementa, a que o crítico José Quitério deu o seu aval, as entradas, as saladas, as massas frescas, risottos e bruschettas, a carne, o peixe e as sobremesas alinham por uma tónica contemporânea que outros preferem descrever como cozinha de raiz latina com um toque de fusão. Mas dela falaria se tivesse comido à la carte. Não foi o caso. Num jantar de grupo nada como optar pelo menu de grupo que, a €25 por cabeça (pode ser negociado para €20 se se abdicar de um prato), inclui couvert (bom o patê de azeitonas), bacalhau desfiado com presunto gratinado e queijo mozzarella, peito de frango recheado com farinheira e, a encerrar, brownie de chocolate com bola de gelado ou gelado artesanal com duas bolas à escolha.


Um menu pré-definido nunca é o ideal para avaliar o talento de um chef, por isso não o farei, mas direi que cumpriu e que satisfez sem chegar a ser banal, que é um risco que se corre nestas coisas. Onde o jantar falhou, na minha perspectiva e de outros convivas, foi no capítulo bebidas. A casa, nas suas contas, calcula uma média de meia garrafa de vinho por pessoa (um tinto alentejano bastante razoável) ou meio jarro de sangria (esta, de rosé e açucarada, veio a revelar-se muito sem graça) ou dois refrigerantes ou ainda duas cervejas, fora as águas e café. Num jantar de família, talvez chegue; num jantar de amigos, acaba por se revelar insuficiente e dar azo à situação sempre desagradável, mas nem por isso inédita, de ter de pagar mais do que o previsto. Fora este pequeno-grande detalhe, nada mais a acrescentar ou a apontar.

Largo Terreiro do Trigo, nº1, tel. 218 821 282, almoços de seg. a sex., entre as 12.30 e as 14.30, e jantares, de seg. a dom., das 19.30 às 00.00 

4.8.10

supercalifragilistic

[Ambiente de uma das salas do SuperCalifragilistic, com o bar ao fundo, D.R.]


No espaço de um mês, mais coisa menos coisa, já fui por duas vezes, em dias diferentes, com amigos diferentes, mas sempre ao jantar, pois o SuperCalifragilistic - a tal palavra mágica que Mary Poppins conseguia dizer sem entaramelar a língua, coisa de que, infelizmente, não me posso gabar... mas também desconfio não ser o único -, aberto de terça a sábado, não serve almoços.
Da primeira vez - que, em rigor, foi à segunda tentativa -, escolhi um sábado, o que me obrigou a reserva com um mínimo de dois dias de antecedência, já que este "tasco atípico", como desde logo se rotulou, caiu no goto dos que não gostam de se ficar pelo óbvio e confiam na propaganda eficaz do boca-a-boca - sem grande estardalhaço, o restaurante-bar tem marcado presença nas revistas da especialidade e aprendeu a usar o Facebook a seu favor.
Situado numa rua curvilínea de Alfama, um bairro que tenta desde há algum tempo, nem sempre com grande sucesso é certo, diversificar a sua oferta para lá das sardinhas assadas e das folias juninas, o SuperCalifragilistic dá-se ao luxo de não precisar de se anunciar com parangonas. Se não souber ao que vai, o mais certo é mesmo passar a porta sem sequer dar por ela. E, no entanto, aos fins-de-semana, as mesas, distribuídas por duas salas acanhadas - tenho ouvido falar numa esplanada, mas não a vi em funcionamento nas vezes em que ali estive -, não chegam para as encomendas.
Ao fundo, o balcão do bar, onde aviam cocktails em vez de copos de três, assanhado no seu padrão de tigresse, é a pièce de resistance da casa, mas, aos poucos, o tasco já afinou a sua decoração e disposição, com algumas trocas, mas mantendo-se sempre fiel ao espírito feira-da-ladra-meets-sala de jantar da avó. Não são os primeiros a apostar na receita, mas a sensação deste Verão explica-se mais pelo serviço/gestão informal da dupla Alexandra Sumares e Sofia Garrido e por uma cozinha despretensiosa e em conta que, sem se armar aos cucos, tem sabido renovar-se e surpreender - nalguns casos melhor, noutros nem por isso, mas sempre com boa vontade.
A ementa, de que também faz parte uma pequena carta de vinhos, é composta por um núcleo mais ou menos fixo de petiscos - como a sardinha explosiva, o vulcão de morcela, os bombons de farinheira, sem contar inúmeras variações montadas sobre pão ou ainda saladas -, dois ou três pratos do dia itinerantes e outras tantas sobremesas à escolha. No final, a conta raramente ultrapassa os €20 por pessoa. Nada mau.
O menos bom fica pela moda que agora pegou em certos meios de não disponibilizar pagamento por multibanco - como se o aluguer de €25 por mês fizesse assim tanta diferença no orçamento de quem se mete nesta empreitada - e pelo ambiente abafado que ali suportei numa das noites mais quentes de Julho, o que não serve de desculpa. Quem quiser ir à vontade, experimente os dias de semana, mas foi o que fiz da segunda vez e, sinceramente, acho que o tasco tem muito mais piada com a casa cheia. Uma questão de gosto, mas que pode fazer a diferença.

post scriptum: informei-me melhor e descobri que, para além do aluguer mensal, o uso do multibanco acarreta taxas para o estabelecimento por cada operação realizada.

Rua dos Remédios, 98, tm. 93 331 1969/91 250 6755, de ter. a sáb., das 18.00 às 02.00
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