26.10.11

fora de portas: the oitavos, parte 1 | as gulodices do chef joaquim de sousa

[As dunas em redor de The Oitavos, na Quinta da Marinha, Cascais; abaixo: sundeck do Atlântico Pool Bar (fotos de divulgação)]

Pergunto-me, e já agora estendo a questão a quem me está ler: a grande maioria das pessoas continua a encarar com reserva os restaurantes de hotel?


Corrijo. Porventura, nem se trata mais de "reserva" no sentido de preconceito. Terá mais a ver, parece-me, com um certo receio de entrar em território "proibido". Posso estar equivocado, claro, mas tenho a impressão que muito boa gente se acanha diante da perspectiva de atravessar o lobby de um hotel para desfrutar apenas do(s) seu(s) restaurante(s).

Estarei enganado?

Uma coisa é certa, essa foi, desde cedo, uma das minhas preocupações e, sempre que se justifica, procuro desmistificar essa coisa dos "restaurantes de hotel". Há os que não passam disso mesmo, mas há também, e são cada vez mais os bons exemplos, aqueles que, por si sós, representam uma atracção à parte.

É o caso de The Oitavos. A escassa meia-hora de carro de Lisboa, na Costa do Estoril, este hotel cinco estrelas, em forma de Y, inaugurou, em finais de 2010, uma nova era para a exclusiva Quinta da Marinha.


Virado para o mar, rodeado de dunas, pinhal e um campo de golfe, The Oitavos começou por ter uma mais-valia nada desprezível — e de que muitos, arrisco-me a dizer, ainda não se deram conta: abriu a um público maior a zona residencial, dotada de excelentes infra-estruturas de lazer, que mais associamos em Portugal aos muito ricos.


E não é preciso ficar ali hospedado.


[O restaurante de assinatura de The Oitavos, o Ipsylon (foto de divulgação)]


Confuso? Eu explico melhor. Aliás, o propósito deste post é, precisamente, falar dos seus restaurantes, num total de quatro, que estão abertos a qualquer pessoa e que, ao contrário do que muitos julgarão, não cobram nenhuma fortuna.


A cargo do francês Cyril Devilliers, a restauração de The Oitavos entrou nos eixos, depois de um começo tumultuado e de alguns desacertos que não vale a pena repetir, e tem, a meu ver (mas não sou o único a reparar), um trunfo muito especial: o chef-pasteleiro Joaquim de Sousa.


[O chef-pasteleiro Joaquim de Sousa, a serviço de The Oitavos desde 2010 (foto de divulgação)]


Acreditem, ele é, na actualidade, um dos melhores que temos no género e foi, em grande parte, responsável pelo patamar de excelência (com prémios vários que o confirmam) que atingiu a doçaria num outro hotel de Lisboa por onde passou, o Pestana Palace.


Nascido em França, o chef de 38 anos fez também muito do seu percurso profissional nesse país, o que se nota bem no tipo de pastelaria fina que pratica. Mais do que apenas um virtuoso, ele é um perfeccionista e um criativo, pelo que tudo o que sai da sua lavra tem sempre um toque de autor.


Com o seu talento reconhecido em diversas competições nacionais e internacionais, a pastelaria de Joaquim de Sousa é o tipo de coisa que justifica plenamente que se vá de propósito a The Oitavos. E que, já agora, se quebrem as ideias-feitas que ainda possam subsistir sobre a possibilidade de, se preciso for, ser legítimo, e perfeitamente natural, entrar num hotel nem que seja só para tomar um café ou fazer um lanche  a qualquer hora do dia.


[Pré-sobremesa por Joaquim de Sousa, com ginjas e gelatina de maracujá (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]


O Ipsylon Restaurante é, por excelência, a mais gourmet e sofisticada de todas as apostas de The Oitavos, pelo que serve apenas jantares. Jantares de assinatura, a que chamaram "Diner du Chef", com um custo de €60 por pessoa (€70 se devidamente maridados com vinhos) e cuja ementa é decidida diariamente pelo chef Cyril Devilliers — de quem falarei num próximo post — com base no que há no mercado.


[Sabores de Outono, um das sobremesas servidas no Diner du Chef (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]


O grand finale dos "jantares do chef", porém, fica por conta de Joaquim de Sousa. Após uma pré-sobremesa, segue-se sempre a sobremesa propriamente dita. No dia, ou melhor na noite, em que ali estive, coube-me em sorte "Sabores de Outono", uma verdadeira orgia para chocólatras: biscuit de chocolate com amêndoa, panacota, trufas quentes de chocolate e sorbet de tangerina.


[E estava tão boa que não sobrou nada... (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]


Joaquim de Sousa, permito-me aqui um pequeno à parte, tem uma predilecção toda especial pelo chocolate. Membro-fundador do Cacau Clube de Portugal e mentor de um projecto de produção de chocolate, ele é, há cinco anos consecutivos, o grande vencedor do concurso "Chocolatier do Ano" promovido pelo Festival de Óbidos.


[Morangos, Hortelã e Creme de Arroz, uma das criações mais bem conseguidas de Joaquim de Sousa, com sorvete de manga ao fundo (@joão miguel simões, todos os direitos reservados)]



Mais uma razão, portanto, para não desperdiçar um bom pretexto. Com quatro áreas de restauração distintas, do mais ao menos formal, do mais ao menos dispendioso, em The Oitavos tiveram a feliz ideia de criar diferentes opções, e situações, para degustar as doces criações de Joaquim de Sousa. Um exemplo disso é a carta do Ipsylon Bar & Lounge, com as seguintes opções:


Tatin Alperce, gelado de amêndoa (€6) 
Morangos, hortelã e creme de arroz (€7,50)
Lima, limão, merengue e manga (€6)
Os 3 Chocolates (€11)
Babá em calda de maracujá e ananás (€7,50)
Chocolate, côco e banana (€9) 
Tequila Sunrise "sólida" (€8) 
Gelados e sorbets (€3, 1 sabor à escolha: baunilha, arroz doce, chocolate, canela, café e whisky; mandarina, ginja, frutos vermelhos, vinho do Porto, limão e hortelã) 
Fruta da época (€5)


[No fundo, trata-se de uma releitura do arroz doce (@joão miguel simões, todos os direitos reservados)]


Além destas opções à carta, estão ainda previstas três outras modalidades de "degustação doce", para quem leva estas coisas mais a sério, pensadas para duas pessoas:


Da nossa carta: Tequila Sunrise, limão e merengue, tatin de alperce e sorbet de manga (€15)
Da tradição: Creme de arroz doce, farófia, toucinho do céu e sorbet de vinho do Porto (€16)
A escolha do Chef: selecção de 8 a 10 variedades à escolha do nosso chefe pasteleiro (€20)

Desenganem-se, contudo, aqueles que julgam que tudo se esgota nas sobremesas. Outras pequenas, mas sempre deliciosas, atenções foram pensadas pelo chef-pasteleiro para acompanhar o café. 

[As mignardises servidas com o café (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]

Sim, um café em The Oitavos pode até custar mais do que numa simples esplanada ou cafetaria (€2,50, a título de exemplo, no Atlântico Pool Bar), mas, em compensação, não chega à mesa sozinho. Consoante os casos, podem ser mignardises (sobremesas em versão miniatura) ou petits fours (doces como bombons, trufas...). Por norma, quando servidas no final de uma longa refeição, estas guloseimas têm uma missão ingrata, pois são poucos os que ainda conseguem ter mais olhos do que barriga após vários pratos e sobremesas; já em em actos isolados brilham por direito, e mérito, próprio.

[Os petit fours servidos com o café (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]

Para terminar, não resisto a partilhar a receita da Tarte Tatin de Alperce servida em The Oitavos (€6), que, gentilmente, o chef Joaquim de Sousa me revelou e ensinou passo a passo.

[Primeiro passo para começar a Tarte Tatin (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]

Ingredientes:
30 gr de massa folhada
100 gr de alperce
50 gr de açúcar
15 gr de manteiga

Para a gelatina de maracujá:
50 gr polpa de maracujá ou sumo
1 folha de gelatina
5 gr de açúcar

Para a guarnição:
10 gr açúcar amarelo
50 gr de gelado ou sorvete
Decoração chocolate
Rebentos e hortelã

[A fase de "empratamento" da Tatin Alperce (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]

Preparação:
Cozer a massa folhada num forno a 200 graus. Uma vez cozida, é o momento de a caramelizar.
Aquecer a polpa de alperce juntamente com o açúcar. Juntar a folha de gelatina (previamente demolhada) e deixar arrefecer no frio.


[A Tatin Alperce em versão final (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]

Unte uma forma com manteiga e cubra a manteiga com açúcar. Em seguida coloque o alperce cortado em quartos e leve ao forno, aquecido a 180 graus, por 10 minutos. Deixe arrefecer.
Quando o alperce estiver frio, coloque-o sobre a massa folhada e caramelize com açúcar. Coloque depois num prato, a que vai juntar a gelatina, decorada com rebentos, e uma bola de gelado ou sorvete a gosto (em The Oitavos servem com gelado de amêndoa), enfeitada com uma armação de chocolate.

The Oitavos, Rua de Oitavos, Quinta da Marinha, Cascais, tel. 214 860 020
4 áreas de restauração distintas, incluindo uma com assinatura gastronómica, o Ipsylon Restaurante; o Bar & Lounge Ipsylon, onde predomina a informalidade; o Atlântico Pool Bar, localizado na zona da piscina exterior; e o restaurante do Oitavos Dunes Club House, o Verbasco

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