14.8.12

vela latina, porque um porto seguro não precisa ser necessariamente cool

[©telmo miller]


Há quantos anos não vai ao Vela Latina

Fiz-me essa mesma pergunta semanas atrás, quando, depois de um longo interregno, entrei no restaurante (não confundir com o snack-bar, que fica também por ali, mas que é um outro conceito).

[O carpaccio (©telmo miller)]

A resposta varia de pessoa para pessoa, mas, de uma forma geral, tem dado que pensar a Guiomar e a Salvador Machaz. Ligada à fundação dos hotéis Tivoli, a família Machaz não está neste negócio há dois dias. Muito pelo contrário; só no Vela Latina, espaço de referência na doca de Belém, com uma localização — a Torre de Belém está a dois e passos e o Tejo, já a fazer-se ao mar, ao alcance do olhar — e uma área que tomara muitos, vão já a caminho das bodas de prata.

[A sala interior, mas com vista (©telmo miller)]

Mas o tempo, nesta como noutras coisas, mesmo quando não é implacável, é sabido, raramente perdoa. Nos idos anos 1990, o Vela Latina ditava modas e não havia guia da boa vida que não apontasse as suas mesas entre as mais influentes da capital. Hoje, entre as suas paredes — cegas, surdas e mudas — continua-se a discutir assuntos de Estado, mas o Vela Latina anda arredado. E olhos que não veem, coração que não sente.

[©telmo miller]

Guiomar e Salvador, primos, receberam o testemunho dos pais e cabe-lhes agora, em tempo de vacas magras (e do famigerado IVA a 23%, último golpe de misericórdia para muitos restaurantes do país), dar continuidade ao legado familiar. O estilo assumidamente náutico da decoração deixou-os divididos – ainda deixa – mas, aos poucos e feitas já algumas pequenas intervenções estéticas (a mais visível delas está na varanda coberta, mais fresca e leve, mas o jardim nas traseiras também deve ganhar em breve melhor uso), estão a chegar à conclusão de que o Vela Latina pode (e deve) ganhar nova clientela sem perder a essência, a discrição e a boa cozinha mediterrânica (onde se inclui um pastel de nata com tradição nas sobremesas) que sempre o caraterizaram e que lhe permitiu manter, independente a modas, um séquito de fiéis onde se incluem inúmeros políticos e empresários da nossa praça. 

[A varanda coberta (©telmo miller)]

São sobretudo estes últimos que dão o tom aos almoços, e que não perdem de vista especialidades da casa como o clássico arroz de coentros com lagosta executado pelo chef Benjamin Vilaça (o peixe e marisco frescos são ponto de honra); aos jantares, há espaço de manobra para ir um pouco além e arriscar mais, embora – crise oblige – os grupos sejam já uma alternativa.

[©telmo miller]

Primeiro fui ao almoço e uns dias depois, com companhia, voltei para jantar. Num caso como noutro, os pratos experimentados, bem executados e bem ao estilo de comfort food (que é como quem diz, técnica de restaurante, mas com sabor a comida de casa), não desiludiram, mas gostei achei a casa mais composta de dia. É a noite — os seus atuais donos sabem-no bem — que representa o maior desafio.

Uma coisa é certa, por algumas voltas que venha a dar, o Vela Latina quer que os lisboetas (e não só) o voltem a encontrar onde sempre esteve. Assim uma espécie de porto seguro. 

Doca do Bom Sucesso, Belém, tel. 213 017 118

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