31.8.12

fora de portas: da terra e do mar, simples assim, porque o verão ainda não acabou na fortaleza do guincho


[Magníficos dias atlânticos no Guincho (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]

Os olhos também comem, é sabido, mas no caso da proposta do restaurante da Fortaleza do Guincho para o último fôlego do verão, nem precisamos preocupar-nos em ter mais olhos do que barriga.

[O amuse-bouche desde logo a prometer frescura, com figos, legumes e vegetais crocantes e flores comestíveis (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]

Porque o propósito é mesmo esse, o de sermos desde logo arrebatados pelos olhos, sem termos depois de carregar o remorso do excesso e do pecado da gula.

[Bouquet de legumes da Quinta do Poial cozinhados com limão confit e manjericão, pãozinho de sémola com Culatello di Zibello (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]

Num dia radioso escolhido a dedo, daqueles raros em que o mar do Guincho surge amansado e nem sinal de vento, Vincent Farges, o chef executivo, quis mostrar que há sempre possibilidades a explorar; até mesmo dentro de um menu sazonal que, logo à partida, tinha apostado mais nos pescados e nos legumes.

[Filete de salmonete assado com óleo de limão, os fígados em condimento com pimento confitado, legumes glaceados com cominhos e açafrão e molho avinagrado (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]

E faz sentido que assim seja, pois a estrela Michelin, o ar rebuscado da Fortaleza (por mais que aqueles janelões do restaurante, sobre o mar, nos façam esquecer tudo o resto) e o rótulo assumido de alta cozinha francesa poderão levar os mais desprevenidos a pensar que verão, leveza, informalidade e Fortaleza do Guincho não rimam.

[Cherne da nossa costa assado com girolles, pequenos legumes com toucinho Colonnata e molho do assado (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]

E a verdade é que pode até dar uma bela rima.

[Borrego Allaiton de Aveyron assado, boulangère de aipo e Pata Negra, barigoule de alcachofras e funcho (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]

Vincent Farges, já aqui o escrevi por mais de uma vez, tem vindo a ganhar protagonismo ao leme do restaurante, sem desprimor para a consultadoria afetiva, a cada três meses, do seu mentor, o chef Antoine Westermann. E é quando está mais solto, e tem por isso maior liberdade criativa e margem de manobra para ousar, que, arrisco-me a dizê-lo, eu mais aprecio a cozinha do Guincho.

[O borrego já com o molho (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]

Não é de hoje que Farges faz a apologia do bom peixe português e que aposta, sem descurar outros produtos essenciais à cozinha que pratica e que não se encontram no mercado nacional, nos legumes produzidos pela Quinta do Poial, mas que bom ver (e saborear) uns e outros num almoço próprio para os dias quentes, com cheiro, sabor e textura a terra e mar.

[Nage de pêssegos com citronela, gelado de lúcia-lima e pequenas Madalenas (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]

A Quinta do Poial tornou-se uma espécie de coqueluche dos chefs (além de Farges, outros adeptos são o José Avillez, do Cantinho e do Belcanto, ou o Henrique Mouro, do Assinatura), dos críticos e de um punhado cada vez mais significativo de consumidores esclarecidos da nossa praça que já não passam sem os seus produtos orgânicos (à venda, todos os sábados, no Mercado Biológico do Príncipe Real). 

[Cerejas salteadas com Kirsch, biscoito e cremoso de pistácio, gelado de Kirsch velho da Alsácia (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]

É justo. Maria José Macedo, a principal responsável pela Quinta do Poial (ou o rosto mais visível, pelo menos), percebeu essa lacuna no nosso mercado e tem sabido produzir, com grande mestria e qualidade superior, legumes e ervas aromáticas de ótima cepa. 

[E que mignardises são estas? (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]

Mais de uma mão cheia deles, nas versões mini (ou baby como também são designados), saltaram para a nossa mesa em criações belíssimas, sem beliscar o seu frescor, de Farges.

[E a praia logo ali, à espreita da Fortaleza do Guincho (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)]

Nas sobremesas, nada a reclamar, muito pelo contrário. Mas, se soubesse, acho que as teria dispensado, em nome da tal leveza que o dia pedia, e ter-me-ia ficado pelas mignardises que vieram com o café. De arregalar os olhos, foi um dó de alma, ai sim, só ter olhos e não mais barriga para as devorar como mereciam.

Estrada do Guincho, Cascais, tel. 214 870 491, todos os dias, almoços entre as 12.30 e as 15.30 e jantares entre 19.30 e as 22.30

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