[Sala do Ipsylon Restaurante e o chef Cyril Devilliers (fotos de divulgação)] |
Volto a The Oitavos e à Quinta da Marinha, na Costa do Estoril, por um motivo mais do que válido.
Quando este hotel cinco estrelas abriu portas há pouco mais de um ano, a sua arquitectura translúcida e o formato em Y não foram as únicas coisas a gerar expectativas e a dar azo a conversas.
Miguel Champalimaud, o mentor do projecto, tinha grandes planos para a cozinha de The Oitavos e para isso contratou o chef francês Aimé Barroyer, com provas mais do que dadas em Portugal ao serviço do Pestana Palace.
Mesmo antes da inauguração, as coisas não correram como o previsto e Barroyer saiu para o Tavares. Em sua substituição, como chef executivo, entrou em cena outro francês radicado em Portugal, Cyril Devilliers.
Nascido na Normandia, onde desde cedo conviveu com uma cozinha de terroir mais rústica, Cyril, de apenas 34 anos, tem feito um percurso digno de registo na alta gastronomia, onde já passou por nada menos que três restaurantes com estrelas Michelin. Em Portugal, antes de assumir a restauração de The Oitavos, foi o braço direito de Joachim Koerper no Eleven, em Lisboa, e chef de banquetes no Penha Longa Hotel, em Sintra.
Nem tudo foram acertos neste meio-tempo. Por outro lado, o facto de os restaurantes ficarem num hotel — ainda para mais num hotel afastado, em plena Quinta da Marinha, tida como um reduto exclusivo e elitista — também não ajudou a que se tornassem mais conhecidos do grande público.
Tudo isso pode mudar agora. Assim haja um trabalho consistente de maior divulgação e se contrariem certas ideias-feitas. Trunfos já têm, como é caso da excelente pastelaria que elogiei no post anterior — que pode e deve ser catapultada como um dos cartões de visita de The Oitavos — e da fórmula "Diner du Chef", com uma boa relação qualidade-preço, de que vou falar a seguir.
[A ementa do "Diner du Chef" (clique na foto para aumentar e ler)] |
A primeira coisa a reter sobre os "jantares do chef" é que não existe uma ementa pré-definida. Com base na estação do ano e no que houver nesse dia no mercado, Cyril Devilliers e a sua equipa criam um menu com entrada, prato de peixe, prato de carne, pré-sobremesa, sobremesa, café e petits fours. O preço por pessoa é de €60 (sem bebidas, pelo que compensa pagar mais €10 à cabeça e fazer a maridagem de cada prato com um vinho).
[Amuse-bouche: croquetes de língua estufada (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)] |
Cyril é quem faz as honras da casa e apesar de, ao longo do jantar, ir várias vezes à mesa, aproveita a chegada dos comensais para os receber na cozinha e lançar uma pequena brincadeira do tipo dou-um-doce-a-quem-adivinhar-o-que-isto-é. "Isto" são croquetes, servidos como amuse-bouche, de ar apetitoso. Primeira trinca e há alguém que arrisca: choco!
Cyril ri-se e não desarma logo. Deixa-nos saborear mais um pouco. Mas ninguém dá mostras de conseguir resolver a charada. Para alguns é tarde demais — porque já comeram e gostaram — quando revela, finalmente, tratar-se de língua de vaca estufada com gengibre, cardamomo e pimenta. Divertido, o chef dá a receita: depois de estufada, é retirada a pele, faz-se um Bechamel com o caldo (e mostarda) e a carne é frita numa tempura muito suave. O resultado final ilude qualquer um, pois não se sente a textura da língua.
[Como entrada, Mexilhões Fartos de Porco Preto (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)] |
Já sentados à mesa do Ipsylon Restaurante, foi-nos servido, como entrada, mexilhões sobre porco preto. A acompanhar várias verduras, mas merece destaque o "caviar" feito com a última colheita da época de beringelas da Quinta do Poial, e o branco Luís Pato Maria Gomes (2010).
[O prato de peixe, Bouchon de Tamboril (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)] |
O prato de peixe veio a revelar-se o meu preferido da noite. Bouchon de tamboril, alho francês confitado em miso (obtido a partir da fermentação do arroz, da cevada e da soja), batata ratte, crème fraîche. Por ser a época deles, Cyril não resistiu a acrescentar alguns percebes. A maridagem foi feita com o mesmo branco da entrada
[O prato de carne, Vitela Mirandesa (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)] |
Nas carnes, nacos de vitela mirandesa, muito macios, com bearnaise e batata recheada tipo tartiflette. A acompanhar, um tinto Monte da Ravasqueira (2009). Há uns tempos perguntei a um outro chef o porquê de não se ver mais carne mirandesa na alta gastronomia e a resposta deixou-me algo desalentado: é difícil encontrar produtores na disposição de vender apenas peças; a maioria exige que se compre o animal inteiro, o que se torna inviável para os restaurantes...
Claro que do "Diner du Chef" fazem ainda parte as sobremesas, mas como me adiantei e falei nelas no post anterior, acho que não preciso me repetir.
[Cyril Devilliers na área externa de The Oitavos (foto de divulgação)] |
O bom de hotéis polivalentes como The Oitavos é que a sua oferta nunca se esgota numa só opção. Por isso mesmo, a fórmula "Diner du Chef" é apenas uma das possibilidades, que pode e deve guardar para uma ocasião mais especial. Para o dia a dia, em que nos apetece coisas mais simples, mais rápidas e menos caras, os outros restaurantes de The Oitavos são, por incrível que possa parecer a alguns, uma alternativa perfeitamente razoável como demostrarei de seguida.
[Na cozinha, Cyril Devilliers prepara mexilhões recheados com carne, que serviria depois como entrada (©joão miguel simões, direitos reservados)] |
Com quatro restaurantes, sem contar os eventos, a seu cargo, o chef normando não tem muito tempo livre para ir até ao fornecedores. Por isso mesmo são eles que, todos os dias, se deslocam até ao The Oitavos, logo a partir das sete ou oito da manhã, para entregar a mercadoria. Este é um processo, claro, que se passa nos bastidores, mas fundamental para assegurar a tal cozinha de mercado, marcadamente sazonal, que Cyril Devilliers quis imprimir como registo.
[A ementa do Ipsylon Bar & Lounge (clique na imagem para aumentar e ler)] |
[No sentido horário: piscina interior, ostras da Ria Formosa, Niguiris e Ceviche, servidos no Ipsylon Bar & Lounge (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)] |
Mas volto à proposta de demonstrar que a cozinha de The Oitavos também pode ser abordável. Nada como um dia de Outono cheio de sol para nos darmos ao luxo de comer alfresco. A ementa do Ipsylon Bar & Lounge é bastante variada, mas é grande o risco de ficarmos logo nos petiscos e snacks, até porque estes se prestam a ser partilhados e dão-nos a ilusão de serem mais leves.
O facto é que, uma vez entusiasmados com a variedade de opções, é fácil darmos por nós numa mesa cheia e sem sabermos muito bem por onde começar. Da lista, provei o Mexido de Bacalhau e Azeitonas (€3,50), os Spring Rolls de Camarão com molho Thai-Chili (3 unid./€4,50), o Ceviche (€10), os Niguiris (3 unid./€3,50) e as Ostras da Ria Formosa ao Natural (3 unid./€6). As ostras estavam especialmente frescas e Cyril não esconde ser um grande admirador das ostras portuguesas.
[O cheeseburger no prato na versão de Cyril Devilliers (©joão miguel simões, todos os direitos reservados)] |
O bom senso "não ter mais olhos do que barriga" não prevaleceu inteiramente. Mais do que satisfeito com os vários petiscos e snacks, cedi ainda à tentação de provar o cheeseburger no prato segundo Cyril Devilliers (€14).
Antes que se apressem a julgar-me (mal) — afinal, onde já se viu optar por fast food em detrimento de outras iguarias —, permitam que me explique: com 180 gr de carne de primeira (tal como acontece na versão hambúrguer no prato), este cheeseburger de assinatura é tão suculento, com seus molhos e tirinhas fritas e crocantes de cebola, que dispensa outros acompanhamentos. Ou, pelo menos, foi assim que fiz. E não me arrependi.
4 áreas de restauração distintas, incluindo uma com assinatura gastronómica, o Ipsylon Restaurante; o Bar & Lounge Ipsylon, onde predomina a informalidade; o Atlântico Pool Bar, localizado na zona da piscina exterior; e o restaurante do Oitavos Dunes Club House, o Verbasco
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